sexta-feira, 29 de junho de 2012

A demografia e o baixo desemprego

Nos últimos meses, o Brasil tornou-se o estranho país que não cresce, mas está em pleno emprego, ou próximo dele. A taxa de desocupação nas seis principais regiões metropolitanas está na mínima histórica, e os salários continuam a aumentar com força. Parte da resposta para esse aparente enigma está no desempenho ainda razoável do setor de serviços, o que mais emprega, e provavelmente também na política das empresas de retenção de mão de obra, num momento em que é difícil encontrar trabalhadores qualificados e existe a expectativa que a economia se recupere na segunda metade do ano.
A menor oferta de mão de obra, contudo, também tem importância nessa história, indicando que a mudança demográfica em curso no país tem um papel relevante para explicar a resistência do mercado de trabalho. A forte queda da taxa de fecundidade no Brasil tem afetado o ritmo de alta da população em idade ativa (PIA) e, com isso, diminuído a velocidade de expansão da oferta de trabalho.
Para o economista Jorge Arbache, assessor da presidência do BNDES e professor da Universidade de Brasília (UnB), o comportamento do mercado de trabalho num quadro de economia estagnada é uma evidência significativa de que a questão demográfica é fundamental para explicar o desemprego baixo.
Menor crescimento populacional impacta mercado de trabalho
O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro patina desde o terceiro trimestre de 2011, quando recuou 0,1% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. Nos dois trimestres seguintes, o avanço foi de apenas 0,2%. Apesar disso, a taxa de desemprego continua muito baixa. Em maio, ficou em 5,5%, feito o ajuste sazonal, o nível mais baixo da série calculada pela LCA Consultores, número já alcançado em novembro e dezembro de 2011.
"Eu não poderia imaginar uma prova mais forte da relevância do fator demográfico para o baixo desemprego", diz Arbache, que há tempos bate na tecla de que a demografia já tem efeitos significativos sobre o mercado de trabalho, um reflexo da forte queda da taxa de fecundidade ocorrida no país nas últimas décadas.
Nos últimos meses, o ritmo de crescimento da população em idade ativa perdeu um pouco mais de fôlego. Nos 12 meses até maio, a alta foi de 1,2%, inferior ao 1,3% de 2010 e também de 2011. Em 2005, o avanço tinha sido de 1,8%.
A expansão mais modesta da PIA tende a reduzir também a velocidade de crescimento da população economicamente ativa (PEA), que reúne as pessoas já ocupadas e as que buscam emprego, embora as duas não andem necessariamente juntas. A desocupação é calculada pela comparação do número de desempregados com a PEA.
O economista-chefe da corretora Convenção Tullett Prebon, Fernando Montero, também vê a menor oferta de mão de obra com um dos principais motivos para explicar a resistência do mercado de trabalho num ambiente de PIB anêmico. E a escassez de mão de obra, nota ele, ocorreu simultaneamente ao desempenho mais forte do setor de serviços, um grande empregador. Em maio, por exemplo, a ocupação no segmento de serviços a empresas cresceu 4,9% sobre o mesmo mês de 2011 nas seis principais regiões metropolitanas, acima da média geral de 2,5%.
Montero destaca que a população economicamente ativa tem crescido menos, contribuindo para derrubar o desemprego. A alta mais fraca da população em idade ativa lhe parece uma história razoável para o fenômeno, que também pode ser influenciado por outros motivos - com o aumento da formalização e a alta de salários, é possível que os filhos dediquem mais tempo ao estudo, demorando mais para entrar no mercado de trabalho, por exemplo.
A escassez de mão de obra também ajuda a explicar a aparente contradição entre os números da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE, e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, na visão do ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman. Os dados do IBGE mostram desemprego em queda e forte alta da ocupação, enquanto o Caged - restrito ao mercado formal - indica uma perda de fôlego na criação líquida de empregos, ou seja, na diferença entre contratados e demitidos.
Para Schwartsman, o que está por trás disso é a menor oferta de mão de obra, e não a demanda mais fraca por trabalhadores, uma vez que os salários continuam a crescer a taxas fortes, na casa de 11% a 12% em termos nominais, na comparação com o mesmo mês do ano passado. "Com a economia próxima do pleno emprego, novas contratações não podem mais ser preenchidas apenas (ou principalmente) por aqueles previamente desempregados, mas cada vez por aqueles já empregados. Como resultado, a criação líquida de empregos deve se desacelerar, mas não, como se pensa normalmente, por uma perda de força da demanda por trabalho, mas sim por restrições de oferta", escreve ele, em relatório da Schwartsman & Associados. Como o Caged mostra a diferença entre contratações e demissões, se uma empresa tira um trabalhador de uma outra companhia, o saldo é nulo, já que ele se desliga de uma para ser admitido pela outra.
Aumentos de salários dessa magnitude, de 11% a 12% nominais, superam com folga a variação da produtividade, elevando o custo unitário do trabalho, ressalta Schwartsman. Nos setores expostos à forte competição internacional, como a indústria manufatureira, isso se traduz em margens de lucro menores, pela dificuldade em repassar aos preços os aumentos de custos. No caso dos serviços, pouco ou nada expostos à concorrência externa, há mais liberdade para reajuste de preços, como fica evidente no comportamento da inflação desse segmento.
O mercado de trabalho estruturalmente mais apertado deixa claro a urgência de se elevar a produtividade da economia, diz Arbache. A demografia aponta para uma oferta ainda menor de mão de obra nos próximos anos; se não enfrentar esse problema, o Brasil terá ainda mais problemas de competitividade


Fonte: Valor Econômico

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