A expansão da economia deu mais poder ao trabalhador. Em busca de melhores
vagas em um mercado aquecido, a quantidade de brasileiros que se demite das
empresas é recorde. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados
(Caged) mostram que 30,5% dos desligamentos no primeiro bimestre ocorreram por
decisão do trabalhador. O País teve quase 3,2 milhões de desligamentos até
fevereiro, sendo 969 mil por iniciativa do empregado.
No primeiro bimestre de 2003, ano do início da pesquisa, a situação era bem
diferente: as saídas voluntárias somavam 17,7%. Os dados anualizados confirmam a
tendência de aumento do desligamento espontâneo. Na média do ano passado, 28,3%
das demissões foram por iniciativa do funcionário - em 2003, a proporção foi de
16,8%. "Numa situação de desemprego mais baixo e com perspectiva de crescimento,
a viabilidade de obter um emprego melhor e uma ocupação mais favorável tende a
ganhar mais força", diz Claudio Dedecca, professor da Unicamp.
Os números do Caged de admitidos este ano comprovam a manutenção do
aquecimento do mercado de trabalho. Até fevereiro, as admissões superaram os
desligamentos em 269,5 mil.
É possível notar uma relação entre o desempenho dos desligamentos espontâneos
com a variação da taxa de desemprego média anual medida pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De 2008 para 2009, por causa da
crise econômica, o desemprego médio anual cresceu de 7,9% para 8,1%; no período,
os desligamentos voluntários caíram de 23,8% para 21,7%.
"Assim que o desemprego cai de novo em 2010, começa a aumentar o pedido de
demissão voluntária", diz a professora Regina Madalozzo, da escola de negócios
Insper. Na avaliação dela, haveria ainda mais desligamentos voluntários se a
legislação trabalhista do País fosse menos rígida.
Com o crescimento dos pedidos de demissão, a influência das empresas no total
de desligamentos perdeu participação. No ano passado, os desligamentos por
decisão das empresas corresponderam a 55,7% do total, o mais baixo da série
histórica.
Regional. As demissões por iniciativa do trabalhador cresceram em todos os
Estados, mas o índice ainda é bastante desigual entre as regiões. Nos Estados do
Norte e do Nordeste, por exemplo, o fim do contrato de trabalho é definido
majoritariamente pelas empresas. "É importante ressaltar que o crescimento (dos
desligamentos espontâneos) se compara às demissões sem justa causa, por
iniciativa do empregador. O grosso das demissões em alguns setores e regiões
ainda é em um volume muito maior por iniciativa da empresa", diz Claudio
Dedecca, da Unicamp.
Nos primeiros dois meses do ano, o Piauí foi o Estado com menos saídas
espontâneas - 11,8% do total. A Paraíba (12%) e o Rio Grande do Norte (13,7%)
são os outros Estados com menor número de demissões voluntárias.
Na contramão, a Região Sul, que tem índices de educação acima da média do
País, é a que tem o maior índice de desligamentos por iniciativa do trabalhador.
Santa Catarina é o único Estado em que os desligamentos espontâneos superam as
outras formas de demissão. Entre janeiro e fevereiro, 46,2% dos trabalhadores
catarinenses pediram demissão. Na sequência do ranking nacional, estão Paraná
(40,1%) e Rio Grande do Sul (35,9%).
Os Estados do Centro-Oeste também apresentam alto nível de desligamentos,
sobretudo Mato Grosso do Sul (35,8%) e Mato Grosso (34,8%). São Paulo também
fica acima da média do País, com 32,9% das demissões por iniciativa do
trabalhador.
Qualificação. O desligamento espontâneo aumentou em trabalhadores de todos os
níveis de qualificação, de acordo com Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
O aumento da oferta de trabalho fez os profissionais qualificados serem
disputados por empresas que sofrem com falta de mão de obra qualificada para
expandir seus negócios, enquanto os profissionais com pouca formação mudam de
emprego em busca de aumento, pois também são beneficiados pela demanda crescente
por seus serviços.
"Se o trabalhador estiver ganhando R$ 800 por mês, mas encontrar um emprego
que pague R$ 1.000, ele não pensa duas vezes em trocar", diz o técnico do
Dieese. "Ele vai arriscar e procurar nova oportunidade." Entre os setores com
maior rotatividade, Lúcio cita a construção civil.
Na avaliação do técnico do Dieese, o mercado de trabalho atravessa um período
único no País, já que antes eram as empresas que colocavam exigências na hora da
contratação. "No passado, quem tinha mais de 40 anos era descartável, enquanto
os jovens não conseguiam emprego pela falta de experiência."
Fonte: Estado de S. Paulo
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